segunda-feira, 25 de junho de 2012

Doce revolta

Minha mãe tá revoltada, tá?
 Ela tá revoltada com a saúde no Rio e no Brasil
 Ela tá aqui, no meio da sala
 e tá revoltada com a política de morte e pobreza
Minha mãe com seus olhos verdes claros
que agora estão escuros porque ela tá revoltada
com o descaso das pessoas, com a falta de empatia
Minha mãe falou, no meio da sala, que anda muito revoltada
com a feiura desses dias...
Minha mãe tá aqui, na minha frente, de um jeito que não dá para crer
Eu a olhei com paciência e ternura
E ela se acalmou com a nova programação da TV.

Simone Fernandes.



sexta-feira, 22 de junho de 2012

DESAVENTURANÇAS



VII

Uma vez, enquanto voava, Paulina encontrou-se com uma espécie encantadora, era meio pássaro, meio gente, meio menino, meio homem e seu sorriso era como o pote de ouro no fim do arco íris.

Voaram juntos pelo cair da tarde que parecia não ter fim. Como se gotas de anoitecer pingassem bem devagar, enquanto bailavam pelo céu que gotejava nuances de paixão. Não havia palavra, nem promessas entre eles, apenas olhares e toques. Como um eclipse raro, um fenômeno natural, uma briga de amor, ou, as pazes. Pareciam saber que tudo poderia durar um instante ou a vida inteira. Desafiavam-se e se rendiam sem reservas e sem pudor.

Mas, ela percebeu que a magnífica criatura trazia marcas e um peso noolhar, como um animal enjaulado que fugira, mas tinha medo de se perder. Como um pássaro viciado que precisava voltar a ser infeliz e seguro. Foi então que notou – o ser mais livre e encantador que conhecera, parecia ser mais aprisionado que ela. E como uma cortina velha e pesada, a noite desabou entre eles.

Simone Fernandes




quinta-feira, 21 de junho de 2012

SUAVE É A NOITE


Nem eu nem Fritzgerald imaginaríamos uma noite tão suave. Somente com a palavra amizade se pode descrever um momento tão terno!

Precisarei de todos os poetas e todas as poesias do universo para expressar a minha emoção diante de tanto carinho.

Milene e Rodolfo, sei que a poesia está para a prosa assim como o amor está para a amizade. E quem há de negar que  esta lhe é superior?

Ao resgatar o Balaio, trouxeram junto um turbilhão de sentimentos, sonhos e emoções à tona.

Tentarei fazer jus a trabalheira que eu suponho ter dado a vocês. Embora, eu saiba e vocês também que eu escrevo de besta, besta!

Obrigada meus amores, por esta surpresa tão linda!
Beijos!

Si Fernandes

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Flor de Papel

Dessas coisas da vida – FLOR DE PAPEL E A ESTÁTUA VIVA.

Nas minhas andanças pela noite do quintal da vida, num dia em que nada estava dando certo, esbarrei com a surpresa, nas escadarias em cerâmicas vermelhas desse mágico lugar. Um tedioso palhaço de nariz azul estava ali exibindo um conhecimento sensacional e eu diria encantador, se não fosse sua forma desnecessária de provar que sabe. Trazia com ele uma cestinha com fragmentos de textos de grandes escritores, ele chamava  a cestinha de oráculo. Eu arrisquei a ver o que oráculo tinha para mim, peguei um papelzinho dobrado e ao abri-lo, Clarice Lispector saiu e sussurrou-me:  –Divertir os outros, um dos modos mais emocionantes de existir. Entendi, Clarice, entendi...

Sentada em um dos vermelhos degraus, olhos grandes me observavam e parecia que, as minhas palavras encontravam empatia em seu sorriso. Enquanto eu discutia com o palhaço de nariz azul sobre o cuidado de não causar repúdio nas pessoas pela literatura e de usar a arte para agregar e não para segregar, pude sentir os grandes olhos se aproximando e quando o oráculo foi mais uma vez solicitado, ela se apresentou: -Olá! Chamo-me Júlia. Eu respondi: –Oi! Sou a Si. Sorrimos e conversamos sobre alguns textos, contei a ela da minha vontade de juntar gente numa conversa calorosa para aquecer uma dessas noites frias de Julho; ela disse que estará lá, seja aonde for, se não estiver em Portugal. Despedi-me do palhaço e de Júlia e continuei a caminhar pelo quintal...

Depois de algum tempo, topando com algumas cenas, voltei às escadas escuras, sentei num dos seus degraus encantados com um copo de sede nas mãos, estava tudo tão igual. De longe ouço uma voz, cantando meu nome, era a menina dos olhos grandes novamente, que dessa vez sentou do meu lado e contou sobre seus sonhos. Nesse momento pude perceber que algo diferente estava acontecendo.  Ouvi-a, atentamente, falar da sua paixão por Tony, um português, que segundo ela, é a primeira estátua viva do mundo; da campanha que seus amigos estão fazendo para ajudá-los a realizar esse sonho de juntar os amores; dos erros e acertos que deu... E de repente uma frase acendeu e iluminou a noite escura –Si, esse amor me curou, penetrou não só em minha mente e coração, mas se instalou em outros órgãos, hoje, como melhor, durmo melhor, penso melhor e reajo melhor... Ele diz que me ama como amam as baleias, há poesia em cada frase que ele me diz e eu não sei mais viver sem esse amor.
O dia clareou, iluminando todo o quintal mágico, nos despedimos e num abraço ela sussurrou não se faz amigos, reconhece-os. Não some, Si, não some.

Branca flor, sentada na escada espera por seu amor que de longe a nutre com poesias. Flor de papel escreve em folhas, suas letras tortas, enquanto sonha. E o que ela viu, foi apenas a estátua viva piscando no final do filme. Brancura de idéias, clareando as escadarias vermelhas.

Si Fernandes.